Conceito de Personalidade

 

H. EYSENCK define personalidade como a «organização mais ou menos estável e perdurável do “carácter”, do “temperamento” e dos “aspetos intelectuais” e “físicos” de um sujeito, que determina o seu ajustamento único ao meio ambiente; o “carácter” reflete de modo mais ou menos estável e perdurável o sistema comportamental volitivo (vontade); o “temperamento” reflete de modo mais ou menos estável e perdurável o sistema comportamental afetivo (emoção); os “aspetos intelectuais” refletem de modo mais ou menos estável e perdurável o sistema comportamental cognitivo (inteligência); os “aspetos físicos” refletem de modo mais ou menos estável e perdurável a configuração corporal e neuroendócrina do sujeito» (H. Eysenck, 1970, p.2).

Nesta definição de personalidade, o autor enfatiza o conceito de organização, estrutura ou sistema, e as características de estabilidade e perdurabilidade no indivíduo.

A noção de comportamento (implicada no referido processo de adaptação) abrange, de um modo amplo, todas as modificações que por ação do sujeito operam no meio ambiente e que promovem o seu ajustamento único.

A par disso, este conceito de personalidade remete para uma organização hierárquica dos elementos do comportamento, cuja importância é determinada pela análise do sistema de relações que estes elementos mantêm uns com os outros.

O conceito de personalidade de H. Eysenck resultou simultaneamente das evidências empíricas obtidas através das investigações experimentais e psicométricas que realizou (análise fatorial e análise de critério) e da consideração dos importantes contributos teóricos de Abraham Roback (1890-1965), com o conceito de carácter, de Gordon Allport (1897-1967), com os conceitos de traço e temperamento, e de Donald MacKinnon (1903-1987), com o conceito de tipo.

O termo “carácter”, que se baseia nas perspetivas de Roback, Howard Warren (1867-1934) e William McDougall (1871-1938), diz respeito ao sistema de tendências volitivas direcionadas que refletem as qualidades de persistência, consistência, força e reatividade do comportamento humano.

O carácter consiste na disposição psicológica perdurável que atua na inibição dos impulsos do instinto de acordo com um princípio regulador e que confere auto-controlo, autonomia e livre arbítrio.

Nesta definição, H. Eysenck utiliza o termo “temperamento” para se referir aos fenómenos característicos da natureza emocional do sujeito, incluindo: a sua suscetibilidade para a estimulação emocional; as características da sua resposta em termos de força e velocidade; a qualidade do seu humor prevalente; e todas as peculiaridades de intensidade e flutuação no humor.

Baseado nas conceções de Wilhelm Wundt (1832-1920), Ernst Kretschmer (1888-1964), McDougall e Allport, o conceito de temperamento comporta três aspetos essenciais do comportamento humano: o emocional, o fisiológico e o cinético.

O termo “aspetos intelectuais” utilizado por H. Eysenck remete para a definição de inteligência como uma aptidão polivalente, versátil e inata, que engloba as aptidões envolvidas na aprendizagem, a capacidade de adaptação em função de uma finalidade e a capacidade para pensar de modo abstrato.

O autor baseou-se nos trabalhos de Cyril Burt (1883-1971), Louis Thurstone (1887-1955) e Raymond Cattell (1905-1998).

Por último, o termo “aspetos físicos” diz respeito à tipologia biológica e constitucional do sujeito (morfologia corporal e configuração neuroendócrina), que estabelece uma relação entre o somático (hereditariamente determinado) e o psíquico (temperamento). Este conceito baseia-se nos trabalhos de Kretschmer.

Na perspetiva de H. Eysenck, a combinação dos conceitos de carácter, temperamento e inteligência, permitem conceptualizar a personalidade como o somatório total dos padrões comportamentais, atuais e potenciais, que são determinados pela hereditariedade e pelo meio ambiente.

Neste sentido, a personalidade é originada e desenvolvida através da interação funcional de quatro sectores fundamentais, nos quais os padrões comportamentais se organizam: o sector volitivo, que diz respeito ao carácter, o sector afetivo, que remete para o temperamento, o sector cognitivo, que é relativo à inteligência, e o sector somático, que se refere à constituição (corporal).

No estudo da personalidade, a associação entre os conceitos abstratos hipotetizados e os comportamentos observados deve ser testável e pode ser examinada através dos métodos de análise fatorial e de análise de critério. Este estudo confere à organização hierárquica dos comportamentos (comprovável) um valor preditivo, que permite analisar as características duráveis (não necessariamente estáticas) da personalidade dos sujeitos (em termos de tipos de personalidade, traços de personalidade, respostas habituais e respostas específicas), e realizar previsões (sustentadas) sobre os seus comportamentos futuros.

Na elaboração do seu modelo de personalidade (Modelo Bi-Dimensional, 1947) e no seu aperfeiçoamento (Modelo P-E-N, 1975), H. Eysenck demonstrou uma especial preocupação com a operacionalização dos conceitos e com a sua comprovação empírica (abordagem nomotética), de modo a demarcar bem a sua posição face às perspetivas psicanalíticas e fenomenológicas (abordagem idiográfica) vigentes na época (Década de 40, no Século XX). O autor considerava que estas perspetivas eram “romanceadas”, por carecerem de cientificidade.

Apesar disso, H. Eysenck pretendeu apresentar uma definição de base consensualmente aceite pelos teóricos da personalidade da época, no sentido de contribuir para o estabelecimento de um Paradigma no domínio da Psicologia da Personalidade.

 

Bibliografia

  • Almiro, P.A. (2013). Adaptação, validação e aferição do EPQ-R para a população portuguesa: Estudos em contextos clínico, forense e na comunidade. Dissertação de Doutoramento, Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação da Universidade de Coimbra, Coimbra.

  • Eysenck, H.J. (1970). The structure of human personality (3rd ed.). London: Methuen.

  • Eysenck, H.J., & Eysenck, M.W. (1985). Personality and individual differences: A natural science approach. New York: Plenum Press.

 

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Almiro, P.A. (2013). H.J. Eysenck: Meio Século de Inovação. Consultado a XX/XX/XXXX em https://hj-eysenck.webnode.pt/.